Domaine Arnoux-Lachaux 2022 — A Colheita que Inaugura uma Nova Era na Borgonha

Domaine Arnoux-Lachaux 2022 — A Colheita que Inaugura uma Nova Era na Borgonha

Há momentos raros na história do vinho em que sentimos, com absoluta nitidez, que estamos perante uma viragem estrutural — uma mudança que redefine horizontes e altera para sempre a forma como entendemos a expressão dos grandes terroirs.
A colheita 2022 do Domaine Arnoux-Lachaux é esse momento! 

Pela primeira vez na história do domaine, todos os vinhos — de Bourgogne Pinot Fin ao Romanée-Saint-Vivant Grand Cru— foram criados exclusivamente em Clayvers, recipientes de cerâmica de precisão, completamente neutros, que permitem uma leitura inédita do Pinot Noir das encostas mais sagradas da Côte de Nuits.

É uma revolução poderosa e profunda, de alcance sísmico: 36 meses de maturação sobre borras finas em cerâmica — sem madeira, sem taninos exógenos, sem interferências aromáticas, sem “assinatura enológica”.
O que chega ao copo é pura terra — directa, nua, cristalina.

Quanto perguntamos ao Charles o porquê, ele responde: “Cada barrica, por mais que totalmente idênticas, tomam seu próprio caminho e não posso lidar com surpresas quando dou a vida nas minhas vinhas… quero que cada uma se expresse com pureza e sem interferências externas ao seus respectivos terroirs.” 

E nós, na Temple Wines, que temos acompanhado de perto a caminhada de Charles e a sua equipa, sentimos um profundo privilégio em testemunhar este momento histórico.

Uma História Centenária em Busca de Pureza

O domínio foi fundado em 1858, em Vosne-Romanée, e permaneceu sempre nas mãos da mesma família.
Com Pascal Lachaux e Florence Arnoux, e mais tarde com a entrada de Charles Lachaux em 2012, o domaine transformou-se num laboratório vivo dedicado à viticultura mais radical, exigente e visionária da Borgonha contemporânea.

Charles trouxe:

– a biodinâmica
–  os palissages altos (high trellising) com échalas de 2 metros , fiel ao espírito do Domaine Leroy, uma das suas grandes inspirações
– a paragem total da desponta (rognage) (desde 2020)
– a não-mobilização dos solos
– o uso integral de engaço
– densidades extremas, como os 16.000 pés/ha de diversas parcelas (60% mais plantas que a norma)
– e um estilo de vinificação cada vez mais depurado, mais longo porém mais infuso

O resultado? Vinhos que impressionam pela emoção e profundidade, precisamente porque expressam o terroir com uma verdade jamais vista antes! E com uma nitidez quase sobrenatural. Cada inclinação, cada veia calcária, cada corrente de ar frio que atravessa um “pedaço de terra”.

William Kelley resumiu isso com uma clareza poucas vezes vista:

“ Lachaux continues to push the boundaries, and it's immensely gratifying to see someone who considers that inheriting some of the greatest vineyards in the world imposes an obligation to take risks that others can't, rather than merely entitling him to a high bottle price.”
Robert Parker’s Wine Advocate

Porquê Clayver? Precisão. Transparência. Pureza Absoluta.

As Clayvers são recipientes de cerâmica feitos na Ligúria, cozidos a cerca de 1280°C, desenhados não para terem uma “temperatura ideal”, mas para atingirem a porosidade equivalente a uma barrica de três anos (cerca de 14 mg/L de oxigénio).

Cada unidade custa entre 8.000 e 8.500 euros — quase sete vezes mais do que uma barrica de topo.
Mas há vantagens inegáveis:

– são totalmente neutras
– não adicionam sabores, taninos ou estrutura
– reduzem o risco de brettanomyces
– reduzem a necessidade de sulfuroso (nenhum foi adicionado aos 2022 até ao momento da prova)
– minimizam manobras, perdas e oxigenação
– não precisam ser substituídas
– são mais sustentáveis do que cortar carvalhos centenários

E sobretudo: permitem uma leitura inédita dos grandes terroirs de Vosne-Romanée, Nuits, Chambolle e Flagey.

Charles consegue ainda enchê-las em apenas um dia e meio — contra duas semanas de enchimento em barricas — o que lhe permite escolher momentos astronómico-naturais específicos:
dia de fruto, lua descendente, céu aberto.

Se o vinho é uma língua, as Clayvers são o microfone de alta fidelidade que capta cada sílaba geológica.

2022: A Primeira Colheita 100% Cerâmica

Este é o ano que marca uma viragem tectónica no estilo do domaine.
Todos os vinhos passaram por 36 meses sobre borras finas em cerâmica, algo nunca antes feito na Borgonha, em nenhuma escala comparável.

O que provámos recentemente no domaine não parece apenas um novo capítulo.
Parece um novo género literário.

O Guilherme descreveu esta sensação de forma quase cinematográfica:

“Ouvir a voz da terra com a nitidez que busca um audiófilo hardcore. Sorver um gole da história e geografia de cada ‘pedaço de terra’ como se fosse um filme em 8K.”

De facto, as texturas são mais profundas e ao mesmo tempo mais diáfanas;
as aromáticas mais limpas, mais focadas;
as bocas mais tensas, mais prolongadas;
a sensação táctil mais pura e altamente mineral.

Há uma certa crueza sagrada, como se a cerâmica tivesse retirado tudo aquilo que não fosse essencial.

O Espírito do Domaine Hoje

A viticultura de Charles é uma das mais radicais e coerentes da Borgonha moderna.
Jasper Morris descreveu-o como:

“A man who has extended the possibilities of just how fine the great wines of Burgundy can be.”
(“Estou entusiasmado por, pelo menos uma vez, ver alguém tentar o que Charles fez e expandir o que é possível nos grandes vinhos da Borgonha.”)

É difícil dizer mais do que isto.

Hoje, todas as vinhas do domaine — dos Villages aos Grands Crus — seguem os mesmos princípios:

– poda tardia em gobelet
– zero mobilização dos solos desde 2020
– vegetação alta, rolada, nunca cortada
– biodiversidade extrema, com leguminosas naturais e fungos benéficos
– intervenção mínima
– equipas enormes no campo (30 pessoas durante os picos de estação)
– 100% engaço
– 100% gravidade
– macerações curtas
– prensa vertical
– barricas usadas cinco vezes, agora substituídas por cerâmica
– colheitas muito cedo
– rendimentos que por vezes descem a 9 hl/ha
– vinhedos onde, literalmente, por vezes quase não se vêem as videiras entre a vegetação

Quem visita os vinhedos percebe de imediato:
é outro mundo.

Não se trata de método.
É filosofia.
É ética.
É coragem.

E é essa coragem que torna Arnoux-Lachaux um dos domaines mais influentes da Borgonha contemporânea — hoje citado como referência por dezenas de vignerons da nova geração. Inclusive, já vemos produtores portugueses a usar as Clayvers, inclusive o nosso querido Domínio do Açor. 

O Nosso Testemunho Pessoal

Tivemos a sorte — e a emoção — de visitar o domaine diversas vezes, antes e depois da revolução liderada por Charles.

É impossível não sentir que estes vinhos são feitos para os que procuram a verdade da terra, não o conforto da enologia.

Como escrevi há tempos:

“Cada garrafa deste domaine é um mergulho em geologia, clima e topografia — uma leitura vertical da Terra Santa, destilada em profundidade, infinitude e pureza.”

Os preços são altos, sim — mas como poderia ser diferente?
Os rendimentos são microscópicos, as práticas quase impossíveis de replicar, o trabalho humano desmesurado. E os vinhos são as mais fidedignas interpretações/manifestações dos terroirs sagrados da Borgonha que alguém pode encontrar. 

E quem abre uma garrafa sabe:
é um dos raríssimos endereços do planeta onde o terroir canta em frequência divina.

Um Novo Marco na Borgonha — e a honra de o trazer para Portugal

2022 marca o início de uma nova era para Arnoux-Lachaux: a era da cerâmica.
Uma era de precisão absoluta, de purismo radical, de expressão territorial levada ao limite do possível.

E nós, na Temple Wines, sentimos um orgulho imenso — quase reverencial — por sermos a casa destes vinhos em Portugal.

Vinhos que, como disse o Guilherme, pertencem à categoria dos pós-modernos fabulosos:
vivos, vibrantes, etéreos, verticais, transparentes e profundamente enraizados na natureza sagrada de sua terra.

A partir de agora, os 2022 descansam mais um ano em cave antes de chegarem ao mercado.
E o mundo — literalmente — aguarda com impaciência.

Nós também.